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quinta-feira, 9 de março de 2017

Habitus segundo Pierre Bourdieu* (texto aula 1º´s anos)

A teoria do habitus é produto de uma construção talhada após muito tempo de pesquisa e observação e, articula-se com outros conceitos desenvolvidos por Bourdieu para a análise de realidades sociais especificas. O habitus está na vida cotidiana de todos e é alimentado pelo meio social e pelas interações entre os indivíduos.

O habitus é então um conjunto de ações e reações incorporadas pelas pessoas a partir da vivência em sociedade. Ele não é aprendido, pois surge das interações sociais do meio e molda as atitudes e os pensamentos, não é consciente, mas segue as regras de convivência em determinado campo social, é a matriz cultural internalizada. Para Wacquant(2002, p.102), “... o habitus é um conjunto de desejos, vontades e habilidades, socialmente constituídas, que são ao mesmo tempo cognitivas,emotivas, estéticas e éticas, como ele é elaborado e como opera concretamente”. O habitus é durável, mas sujeito a mudanças a partir de influências que o transformam ou se sobrepõem a ele agindo na sua estrutura estruturante e redirecionando-a.

Como produto de um meio especifico o habitus é alterado sempre o indivíduo transite em outros campos, para entrar no jogo em um campo diferenciado existirão mudanças no comportamento. As regras que regem cada campo específico diferem e, portanto exigem alterações significativas no modo de ação. É necessária uma postura adequada em relação ao local e as pessoas pertencentes ao campo social enquanto o indivíduo permanece naquele campo.

A incorporação do habitus está condicionada ao campo, então existe uma dependência entre as duas noções. Os conceitos são entrelaçados e interdependentes,pois, um campo é também determinado pelas pessoas, suas atitudes e posturas.

O campo social é um espaço determinado pelas pessoas que pertencem a ele e que possuem características e concordâncias às regras determinantes que regem este meio. O habitus é condição e condicionante do campo. Um indivíduo que não tem as características ou não consegue adaptar o habitus para o convívio em grupo será excluído do campo por não possuir pertencimento a esse

O habitus possui características duráveis, mas não imutáveis, existe uma margem de adaptação possível, mas também limitada pela constituição singular na qual foram absorvidos em meios diferenciados e, gerando uma construção híbrida que permite o trânsito do agente por campos diversos, sempre respeitando as regras de cada um deles para conseguir com isso entrar no jogo.

* Trabalho apresentado na VIII Jornadas de Sociología de la UNLP (Univesidade Nacional de La Plata). Veja a integra na fonte.


terça-feira, 7 de março de 2017

A Sociologia como ciência da Sociedade (texto aula 1º´s anos)

Antes de descrever o que os principais autores da Sociologia afirmaram sobre a socialização dos indivíduos é necessário escrever uma breve história da disciplina.

A Sociologia é uma ciência nova, que tem pouco mais de um século de vida. Ela desenvolveu-se, como disciplina acadêmica, em um momento de intensas transformações da sociedade europeia.

Vejamos o que aconteceu na Europa a partir do século XV até o século XIX.

Você já deve ter estudado em História que nesse período ocorrem grandes transformações econômicas: as trocas comerciais se expandiram, os europeus entraram em contato com outros povos, da Ásia, da África e das Américas, intitulado como “descobrimentos” e, por meio de pilhagens e saques, promoveram um acúmulo de riqueza inigualável até aquela época. A expansão marítima foi acompanhada por um grande desenvolvimento das ciências e o florescimento e a expansão da cultura europeia que, a partir do Renascimento, transformou o homem europeu no modelo universal de razão e humanidade.

A partir do século XVIII, com a primeira Revolução Industrial, a produção de mercadorias se expandiu, assim como o crescimento das cidades. Uma nova classe dominante – a burguesia – tornou-se a proprietária das fábricas, das terras, das matérias-primas, apropriando-se do resultado da produção das riquezas a partir das sociedades europeias.

Paralelamente a esse processo, ocorreram grandes transformações políticas. Com o poder econômico da burguesia, os feudos medievais começaram a desaparecer e iniciou-se um processo de surgimento dos Estados Nacionais. Em 1789, aconteceu a Revolução Francesa, que inspirada pelo Iluminismo e sob o lema da “Igualdade, Fraternidade e Liberdade”, declarou que os homens eram todos iguais perante a Lei e tinham direitos universais, lançando as bases políticas do que ficamos entendendo, mais tarde, como cidadania.

Para ilustrar melhor as mudanças que ocorreram nesse período, vejamos alguns quadros comparativos entre a Idade Média e o início dos chamados “Tempos Modernos”.

Fonte: OLIVEIRA. Luiz Fernandes & COSTA. Ricardo C. Rocha, “Sociologia para jovens do século XXI”, Editora Imperial Novo Milênio, Rio de Janeiro, 2010 - págs. 24 e 25. 

domingo, 5 de março de 2017

O pensamento sociológico brasileiro (texto 2 - aula 3º´s)


Obras de Candido Portinari

O pensamento sociológico brasileiro do século passado parecia compreender as mudanças pela qual a estrutura da sociedade passava. Cinco décadas depois, esse pensamento tomou novos rumos e parece ter descartado a produção intelectual daquela geração de sociólogos e estudiosos do Brasil. Para Bernardo Ricupero* “O Brasil continua a ser um enigma, o que provavelmente faz com que ainda sintamos a necessidade de voltar aos autores que enfrentaram essa questão”, destacou ele nesta entrevista que segue. Confira a entrevista.

IHU On-Line - Que tipo de reflexão podemos fazer hoje sobre o pensamento sociológico e político brasileiro se, desde que saímos da ditadura, passamos por governos tão diferentes um do outro e que parecem nunca satisfazer totalmente o povo?
Bernardo Ricupero - Não deixa de ser interessante perceber que o tipo de trabalho que analiso no livro – as chamadas “interpretações do Brasil” – também surge de uma insatisfação, posterior à proclamação da República. Autores como Oliveira Vianna (1) notam o descompasso entre proclamações grandiosas, que deveriam garantir a “coisa pública”, e a persistência de práticas mesquinhas e particularistas. Vão, então, se lançar a realizar grandes explicações do País, espécie de livro que não existiu durante o Império. Outro momento de crise – o pós-1930 – será o mais fecundo para as “interpretações do Brasil”. Não por acaso, são nesses anos que Gilberto Freyre (2), Sérgio Buarque de Holanda (3) e Caio Prado Jr. (4) escrevem seus principais livros.
Diria, portanto, que as crises têm se revelado momentos especialmente frutíferos para nos pensarmos. É como se nessas situações fossemos obrigados a nos perguntar: quem somos e o que queremos ser?

IHU On-Line - Você analisa o pensamento dos principais estudiosos da sociedade e política brasileira. Como acha que Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Celso Furtado veriam, hoje, a educação, a sociedade e a política feita por nós?
Bernardo Ricupero - Um ponto que esses autores e outros, como Caio Prado Jr., Raymundo Faoro (5) e Florestan Fernandes (6), destacam é como nossa história é feita sem rupturas significativas com o passado. Têm, porém, diferentes perspectivas teóricas e políticas para analisar o fenômeno. Assim, o marxista Caio Prado Jr. e o cepalino Celso Furtado (7) destacam a grande continuidade entre a orientação econômica da colônia e da nação que surgirá do pós-independência, que faz com que parte significativa da produção e da vida brasileira estejam voltadas para fora. Já a análise de Sérgio Buarque de Holanda é mais culturalista, insistindo que a proximidade das relações sociais torna difícil constituir democracia e qualquer ordem mais racional no Brasil. Raymundo Faoro, por sua vez, usando categorias weberianas: acredita que um Estado patrimonialista, cuja origem remontaria a Portugal, oprimiria a sociedade. A postura de Gilberto Freyre é, porém, diferente da dos demais autores, ao encarar de maneira positiva o patriarcalismo que teria se formado na colônia e que estaria desaparecendo com a urbanização.

IHU On-Line - Neste atual momento, o que é o Brasil?
Bernardo Ricupero - O Brasil continua a ser um enigma, o que provavelmente faz com que ainda sintamos a necessidade de voltar aos autores que enfrentaram essa questão. Mas talvez a melhor sugestão seja mesmo a do Tom Jobim (8): “o Brasil não é para principiantes”.

IHU On-Line - Como você vê a influência do capitalismo nas lutas políticas ocorridas no Brasil nestes últimos anos?
Bernardo Ricupero - Como Caio Prado Jr., diria que o Brasil se forma no quadro do aparecimento do capitalismo como sistema mundial de produção de mercadorias. É este o “sentido” de nossa colonização: produzir, em grandes unidades trabalhadas pelo braço escravo, bens demandados pelo mercado externo. As principais determinações da vida brasileira continuam a se dar pelo capitalismo mundial, é verdade que transformado. Talvez o mais preocupante é que hoje o horizonte da formação da nação – algo tão presente para a maior dos autores com os quais trabalhei no livro – tenha se perdido...

IHU On-Line - Qual é a importância de retomarmos o pensamento de certos pesquisadores da sociedade brasileira, para a entendermos hoje?
Bernardo Ricupero - Retomo o que disse antes: nossa história é uma história feita sem rupturas com o passado. Assim, em boa medida nossos problemas também são os problemas do passado, com a agravante que não deixam de surgir novos. Nesses termos, as questões colocadas por Oliveira Vianna, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Jr., Raymundo Faoro e Florestan Fernandes continuam, em boa medida, atuais. Ainda hoje, não podemos deixar de levar em conta problemas como a artificialidade de nossas instituições, os efeitos da proximidade de nossas relações sociais, a orientação da economia voltada para fora das necessidades de nossa população; questões essas que foram levantados por esses autores.

*Bernardo Ricupero é sociólogo graduado pela Universidade de São Paulo onde também realizou mestrado e doutorado em ciência política. É vice-presidente da Associação Editorial Humanitas, pesquisador do Núcleo de Apoio à Pesquisa sobre Democratização e Desenvolvimento (NADD) e, também, é professor da USP. 

Notas:
(1) Francisco José de Oliveira Vianna foi um professor, jurista, historiador e sociólogo brasileiro, imortal da Academia Brasileira de Letras. Suas obras, versando sobre a formação do povo brasileiro, tem o mérito de ser das primeiras que tentaram abordar o tema sob um prisma sociológico e diferenciado. Entretanto, a crítica que hoje é feita diz do cunho eminentemente conservador das mesmas. Como jurista, especializou-se no Direito do trabalho, ramo então nascente no Brasil, que ajudou a consolidar, além de haver sido o organizador da legislação que criou o imposto sindical.

(2) Gilberto de Mello Freyre foi um sociólogo, antropólogo e escritor brasileiro. E considerado um dos grandes nomes da história do Brasil. Freyre estudou na Universidade de Columbia nos Estados Unidos, onde conheceu Franz Boas, sua principal referência intelectual. Seu primeiro e mais importante livro é Casa-grande & senzala, publicado no ano de 1933. Em 1946, Gilberto Freyre é eleito pela UDN para a Assembleia Constituinte e, em 1964, apoia o movimento cívico-militar que derruba João Goulart.

(3) Sérgio Buarque de Holanda foi um dos mais importantes historiadores brasileiros.  Publicou em 1945 e 1957, respectivamente, Monções e Caminhos e fronteiras, que consistem em coletâneas de textos sobre a expansão oeste da colonização da América Portuguesa entre os séculos XVII e XVIII. Viveu na Itália entre 1953 e 1955, onde esteve a cargo da cátedra de estudos brasileiros da Universidade de Roma. Em 1957, trabalhou na USP. O concurso para esta vaga motivou-o a escrever Visão do paraíso, livro que publicou em 1958, no qual analisa aspectos do imaginário europeu à época da conquista do continente americano. A partir de 1960, passou a coordenar o projeto da História Geral da Civilização Brasileira. Em 1962, assumiu a presidência do recém-fundado Instituto de Estudos Brasileiros. Entre 1963 e 1967, foi professor convidado em universidades no Chile e nos Estados Unidos e participou de missões culturais da Unesco em Costa Rica e Peru. Em 1969, num protesto contra a aposentadoria compulsória de colegas da USP pelo então vigente regime militar, decidiu encerrar a sua carreira docente. A revista IHU On-Line número 205 foi dedicada a uma análise, por meio de entrevistas, sobre a sua obra Raízes do Brasil.

(4) Caio da Silva Prado Júnior foi um historiador, geógrafo, escritor, político e editor brasileiro. As suas obras inauguraram, no país, uma tradição historiográfica identificada com o marxismo, buscando uma explicação diferenciada da sociedade colonial brasileira. Em 1942, publicou o clássico Formação do Brasil Contemporâneo - Colônia, cujo objetivo inicial era traçar o quadro de evolução histórica brasileira. Inicial, pois seria dividida em partes, já visto que o primeiro livro versa sobre o período colonial, contudo, as outras partes jamais foram escritas pelo autor. Foi eleito deputado estadual pelo Partido Comunista Brasileiro (1945) e constituinte em 1946, tendo o seu mandato sido cassado quando da decretação da ilegalidade do partido.

(5) Raymundo Faoro foi um escritor, advogado, cientista político e historiador brasileiro. É autor de Os donos do poder, obra que aponta o período colonial brasileiro como a origem da corrupção e burocracia no País, colonizado por Portugal, então um Estado absolutista. De acordo com o autor, toda a estrutura patrimonialista foi trazida para cá. No entanto, enquanto isso foi superado em outros países, acabou sendo mantido no Brasil, tornando-se a estrutura de nossa economia política. Faoro conclui que o que se teve no Brasil foi um capitalismo politicamente orientado, conceito este de inspiração weberiana. Negando-se em atribuir um papel hipostasiado à economia com relação à política, Faoro no País uma forma pré-capitalista. Esta característica pré-capitalista, no entanto, ainda será entendida no interior do pensamento weberiano em que capitalismo é definido como uma aquisição racional de lucros burocraticamente organizada, diferente do capitalismo politicamente orientado em que tal aquisição será direcionada por interesses dos Estado e da sua concorrência com outros estados.

(6) Florestan Fernandes foi um sociólogo e político brasileiro. Nas obras em que defendeu, Florestan constrói a estrutura da tribo dos Tupinambá, já desaparecida na época, por meio de documentos de viajantes. Concluído o doutorado, Florestan passou a livre-docente da USP na cátedra de Sociologia I, e posteriormente, tornou-se catedrático. Devido ao seu engajamento na universidade, foi perseguido pela ditadura militar e foi cassado com base no Ato Institucional nº 5. Fugiu então em exílio, em 1969, para o Canadá, aonde assumiu lugar de professor de Sociologia na Universidade de Toronto.

(7) Celso Monteiro Furtado foi um importante economista brasileiro. Suas idéias sobre o desenvolvimento e o subdesenvolvimento divergiram das doutrinas econômicas dominantes em sua época e estimularam a adoção de políticas intervencionistas sobre o funcionamento da economia. Na década de 1950, Furtado presidiu o CEPAL-BNDES, que elaborou um estudo sobre a economia brasileira que serviria de base para o Plano de Metas do governo de JK. Mais tarde, foi convidado pelo professor Nicholas Kaldor ao King`s College da Universidade de Cambridge, Inglaterra, onde escreveu Formação econômica do Brasil, clássico da historiografia econômica brasileira. Retornando ao Brasil, assumiu uma diretoria do BNDE e participou da criação, em 1959, da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). Em 1962, no governo João Goulart, foi nomeado o primeiro Ministro do Planejamento, elaborando o Plano Trienal. Com o golpe militar de 1964, teve seus direitos políticos cassados por dez anos. De 1986 a 1988 foi o ministro da Cultura do governo José Sarney.

(8) Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim foi um compositor, maestro, pianista, cantor, arranjador e violonista brasileiro. É considerado um dos maiores expoentes da música brasileira e um dos criadores do movimento da Bossa Nova. Tom Jobim é um dos nomes que melhor representa a música brasileira na segunda metade do século XX e é praticamente uma unanimidade entre críticos e público, em termos de qualidade e sofisticação musical.


Brasil o país dos desiguais (texto 1 - aula 3º´s)


Por Pochmann*

A enorme concentração da renda e da riqueza é marca registrada do país. O motivo da perversão distributiva é a correspondente concentração do poder. E, na raiz deste fator, está a fragilidade da democracia brasileira. Em cinco séculos de história, não somamos mais de quarenta anos de regime democrático.

Identificar renda e riqueza extremamente concentradas no Brasil não constitui nenhuma novidade. E dizer que isso representa uma herança secular, de difícil superação, tampouco adiciona algum grau de inovação ao já conhecido atualmente. Mas a compreensão das principais razões que produzem uma repartição tão desigual da renda e da riqueza, bem como sua reprodução nos dias de hoje, pode ser motivo de interesse. Especialmente quando se trata de investigar a viabilidade da formulação de medidas cabíveis para sua superação.

Da colonização aos dias de hoje, a riqueza social tem sido pessimamente repartida entre o conjunto da população. De acordo com o Atlas da exclusão social – os ricos no Brasil (Cortez, 2004), percebe-se a continuidade secular no grau de concentração, desde a data em que passa a haver algum registro contábil da riqueza no país. Ao longo do seu processo histórico, o Brasil percorreu distintas fases: Colônia (1500- 1822), Império (1822-1889), República (após 1889). Mas não houve modificação substancial de seu perfil distributivo. Apesar do aparecimento de novos personagens ricos, que se diferenciaram das famílias tradicionalmente assentadas na riqueza primário-exportadora, protagonizando o capitalismo industrial (1930-80) e a financeirização (em curso desde 1981), a desigualdade de renda permaneceu estável. Uma pequena parcela da população apropria-se de muito, enquanto a maior parte dos brasileiros fica com bem pouco.

PADRÃO EXTREMAMENTE CONCENTRADO

Em síntese, o Brasil caracteriza-se por construir um padrão extremamente concentrado de partição da renda e da riqueza.

Os dados disponíveis e confiáveis indicam a persistência estrutural do jogo da distribuição pessoal da renda e da riqueza, mesmo quando ocorre o aparecimento de novos jogadores. Os 10% mais ricos da população impõem, historicamente, a ditadura da concentração, pois chegam a responder por quase 75% de toda riqueza nacional. Enquanto os 90% mais pobres ficam com apenas 25%. Independentemente dos padrões de desenvolvimento econômico pelos quais o Brasil passou, prevaleceu a estabilidade na desigualdade de repartição da renda e da riqueza entre seus habitantes.

Essa situação se agravou ainda mais com o fim do ciclo de industrialização nacional (1930-1980), quando a fatia correspondente à renda do trabalho na composição da renda nacional encolheu substancialmente. Do final da década de 1970 à metade da primeira década do século XXI, a participação do rendimento do trabalho na renda nacional caiu quase 12 pontos percentuais. Simultaneamente, cresceu a porcentagem relativa às formas de riqueza associadas aos proprietários (lucros, juros, aluguéis, renda da terra).

A concentração da renda e da riqueza é uma marca inalienável do Brasil. De acordo com o Atlas citado, embora o país possua aproximadamente 60 milhões de famílias, 45% de toda a renda e a riqueza nacionais são apropriados por apenas 5 mil famílias extensas.

Esse descalabro – já dissemos – não é algo recente. Pelo contrário, vem sobrevivendo a todas as mudanças históricas: o rompimento com Portugal, o fim da escravidão, a passagem para a República. Vem sobrevivendo também à sucessão dos distintos ciclos econômicos. Tanto os ciclos primário-exportadores (pau-brasil, açúcar, ouro, café, borracha), que se prolongaram até o começo do século XX, quanto o desenvolvimento industrial-urbano subseqüente apenas modificaram as fontes da riqueza, mantendo praticamente intacta a concentração na distribuição dos frutos do crescimento econômico.

Desde 1980, com o abandono do projeto de industrialização nacional, tem avançado no país o ciclo da financeirização da riqueza, que traz em seu bojo o retorno ao modelo primário-exportador de matérias-primas e produtos agropecuários (agronegócios). Da mesma forma que os ciclos econômicos anteriores, o padrão distributivo segue inalterado, a não ser pelo aprofundamento da desigualdade de renda e riqueza. Entre 1980 e 2000, quando o crescimento econômico foi pífio, se tornou geograficamente mais concentrada ainda a presença dos ricos no Brasil. Atualmente, somente quatro cidades (São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte) concentram quase 80% de todas as famílias ricas do país.

Como explicar tal situação? A resposta talvez possa ser encontrada na estabilidade do conservadorismo no poder. Assim como a renda e a riqueza, o poder no Brasil encontra-se extremamente concentrado. Daí porque o país jamais ter vivido alguma experiência revolucionária. Levantes existiram, mas sempre massacrados pelas forças conservadoras. Mesmo a revolução burguesa terminou por não acontecer aqui. E as reformas civilizadoras do capitalismo contemporâneo também deixaram de ocorrer de maneira efetiva. Sem revoluções e sem reformas consideráveis, o padrão distributivo não seria modificado. A passagem de um modo de produção a outro mostrou-se inofensiva ao padrão excludente de repartição da renda e da riqueza.

O DESAFIO BRASILEIRO

Entre nós, a ausência de democracia consolidada parece ser a grande razão do conservadorismo e da concentração do poder. Em seus mais de cinco séculos de existência, o Brasil não contabilizou mais de quarenta anos de regime democrático. Pois é claro que não se pode chamar de democracia o que ocorria durante a fase imperial do século XIX e a República Velha (1889-1930). Tratava-se, isto sim, de um regime censitário, capaz de disponibilizar o voto tão somente para a população masculina com posses e renda: cerca de 1% da população!

Deve-se destacar ainda que o processo eleitoral não era secreto. Somente a partir da década de 1930, o Brasil avançou rumo à consolidação do voto universal e secreto, embora deixando de fora a população analfabeta. Mas, justamente nesse período, sobrevieram duas ditaduras, a do Estado Novo (1937-45) e a do regime militar (1964-85) – bem quando se definiu um novo pacto de poder favorável à industrialização (década de 1930) e quando o país registrou as maiores taxas de crescimento da renda (o “milagre econômico” de 1969-73).

Nos períodos em que autoritarismo predominou, os ricos foram favoravelmente beneficiados, mantendo-se inalterado o padrão distributivo excludente. Os apelos populares e progressistas em favor da melhor repartição dos frutos do crescimento econômico foram marginalizados do núcleo de poder. Nos períodos democráticos, a convergência para o desenvolvimento de um projeto revolucionário ou mesmo reformista foi sub-sumida pela administração das emergências e pelas articulações políticas entre distintos extratos de classes sociais, muitas vezes necessárias à governabilidade. Por conta disso, o encaminhamento das questões referentes à alteração do padrão distributivo ficou em segundo plano.

As ações de governo terminam se direcionando a tarefas de curto prazo, incapazes de alterar a estrutura de concentração dos agregados de renda e riqueza. Reciprocamente, a concentração do poder econômico e político impõe obstáculos profundos à gestão o país. O reacionarismo das elites que concentram o poder tem inviabilizado a concretização de reformas em um ambiente democrático. Na ausência de revolução e reformas, geralmente obstadas pelo conservadorismo, as políticas públicas ficaram no meio do caminho.

* Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas.(CESIT) e Ex- Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Leia a íntegra do texto na fonte.

O que é Sociologia ? (1ª aula - Todas Turmas)

A Sociologia se ocupa de estudar a vida social humana, analisando as dinâmicas da sociedade como um todo e de segmentos que a compõem. É o campo do conhecimento que investiga as relações sociais entre diferentes grupos humanos, seus conflitos e conexões. Assim como o psicólogo se dedica a conhecer os elementos que regem o comportamento de um indivíduo, os sociólogos têm como missão compreender o funcionamento do comportamento coletivo.

A Sociologia nos ensina a observar o mundo a nossa volta sob um novo ângulo.
 Comportamentos e instituições que aparecem como naturais – como algo que sempre foi igual – aos olhos do sociólogo são fenômenos dotados de influências históricas e sociais. Aprende-se que algumas coisas que percebemos como experiências individuais, na verdade são ações influenciadas pelo meio social em que crescemos e vivemos. As formas como refletimos essas profundas influências é objeto de estudo da Sociologia. A primeira vista, essa abordagem parece nos destituir de autonomia sobre nossas ações, mas a verdade é que ocorre o contrário. Ao conhecer as forças sociais que atuam sobre a nossa vida, ganhamos mais liberdade para tomar decisões de forma consciente.

Essa operação – em que deixamos de lado as aparências imediatas das coisas para compreender o contexto amplo em que estão inseridas – é o que chamamos de imaginação sociológica. O que fazemos ou deixamos de fazer diz muito sobre o ambiente social que habitamos.

Com a diversidade de culturas e de grupos sociais que temos no mundo, é necessário que a Sociologia acolha uma imensidade de temas. Alguns desses temas centrais, que irão definir as áreas de pesquisa dos sociólogos, são: a política, o trabalho, a economia, a religião, a educação, as etnias, a pobreza, as classes sociais, a ecologia, a comunicação e a mídia, os crimes e o sistema punitivo, o convívio entre diferentes gerações, o gênero e a sexualidade, os movimentos sociais e muitos outros. Essas áreas de pesquisa nem sempre são homogêneas, pois englobam diferentes interpretações e formas de abordar os fenômenos sociais, fazendo da Sociologia uma disciplina bastante vasta e envolvente.

Bibliografia: GIDDENS, Anthony. Sociologia, 2005.

Objetivos Gerais no Ensino da Sociologia*


Principal
Contribuir para desenvolver as habilidades cognitivas (processo mental de percepção, raciocínio) para compreender a seguinte distinção: a diferença entre o que as pessoas, grupos ou governos definem como problema social e o que os sociólogos chamam de problema sociológico. Na definição do problema social, estamos diante da realidade cotidiana do cidadão.

Secundário
Adquirir o necessário distanciamento da percepção do senso comum. Isto implica desenvolver uma atitude de “estranheza” frente às práticas da vida cotidiana trazendo, como consequência, a “desnaturalização” das concepções rotineiras de realidades sociais, permitindo que se possa desenvolver uma nova visão, de natureza sociológica, reconhecendo em nossas ideias comuns sobre a vida social a marca do viés próprio a cada cultura e as condições do tempo histórico em que se situam.
Apresentar conceitos, teorias e doutrinas que fornecem a identidade da Sociologia vista como disciplina científica. É neste celeiro teórico, especialmente o dos autores clássicos, que iremos buscar as ferramentas que auxiliam na formação de uma atitude de distanciamento cognitivo  em relação ao mundo em que estamos imersos.

* Objetivos segundo o Parâmetro Nacional Curricular da Sociologia para o ensino médio.